A filosofia da confusão: por que “actual” em inglês e “atual” em português querem dizer coisas diferentes?

Incontáveis vezes ouvi nas entrevistas de avaliação de conhecimentos de inglês os entrevistados usarem “actual” achando que estão dizendo “atual”.  Usos como “in my actual job”, “our actual situation” e “his actual problems”,  querendo dizer “in my current job”, “our current situation” e “his current problems”, sempre aparecem.

Ai, nas listas dos tais falsos cognatos – que poucos decoram, porque lista é uma chatice, está assim:

Actual (en) = verdadeiro, real

Atual (pt) = current, present

Mas olhe só, que interessante: “actual” assim como “atual” tem a mesma raiz. Isso significa que as duas palavras, que hoje significam coisas diferentes nas duas línguas, tem origem em uma única palavra, antiga: actualis, que ninguém mais usa. De certo modo, faz sentido. E é isso que explico abaixo.

Por que as pessoas que falam inglês um dia interpretaram actualis como algo que significa “verdadeiro, real”? E por que as pessoas que falam português um dia interpretaram actualis como algo que significa “presente, do momento, atual”?

Porque actualis, antigamente, era “ativo, pertinente à ação”. Tinha relação com agir, fazer acontecer. Por esse caminho, é a ação o elo perdido entre o presente e a realidade. É a ação que une esses dois significados aparentemente sem qualquer relação (imagina!).

Agora a coisa toda virou momento de sabedoria. O que é verdadeiro e real só pode ser presente. Por quê? Porque tudo o mais, que pertença ao passado ou ao futuro, é memória, representação ou projeção, desejo. Se não, faça uma experiência. Tente lembrar de algo e peça para outra pessoa lembrar também. Festa de aniversário, enterro, reunião. Quando compartilhar a memória, vai ver que a outra pessoa lembra de outros detalhes ou fatos que não os que a sua memória trouxe. E o futuro? Cada um projeta o seu. O compartilhamento mais certo é a incerteza.

A confusão entre o que é de fato (actually, de verdade) e o que é atual (current, present) guarda uma pérola: a consciência de que só é real o momento presente.

Essa confusão é, além de filosófica, um grande alerta. Deixando-nos levar pelos usos, acabamos tomando a realidade por aquilo que usamos para representá-la, as palavras. Elas nos levam onde querem até nós decidirmos onde queremos ir com elas.

Real, mesmo, só o momento presente. Chazam!

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