Texto publicado no dia 10/08 no jornal A Hora, de Lajeado, RS.

Quantas vezes escutamos isso? Foi exatamente essa afirmação que me motivou a escrever o livro A Gramática Intuitiva. No meu envolvimento com o ensino-aprendizagem de línguas estrangeiras, comecei a perceber que as maiores dificuldades para compreender a nova língua já aconteciam por desconhecermos o funcionamento da língua em português. Trata-se de uma inconsciência. Por causa de um passado escolar com estudo de regras em grande parte desconexas de nossa realidade, temos uma dificuldade básica – de base – com isso. Estamos quase todos de uma ou outra forma tradicionalmente desconectados do idioma que falamos. Isso nos remove a chance de assumir poder sobre a nossa comunicação.

Para reagir à crença “Não sei português” costumo pensar: “mas não pode ser, como é possível tanta gente negar que sabe a língua que fala?!”. É uma generalização destrutiva, que acaba – com muita competência inclusive – criando uma sensação de impotência. Veja: para mim – e para você, mesmo que não tenha pensado sobre isso – a linguagem é o mundo. Afinal, construímos o mundo com a articulação da linguagem. Eu, particularmente por causa do meu trabalho e interesse, construí minha vida e meu sustento pensando e falando sobre a língua.

Mas suponha que você não viva de trabalhar com idiomas: Você é um usuário da língua portuguesa falada no Brasil, o português brasileiro, um nome bem-vindo. Digo que é bem-vindo pela diferença formal que apresenta em relação ao português de Portugal, e também por razões culturais e até mesmo de nossa autoestima. Ao nos darmos conta da diferença de usos e características em um e outro caso, fica claro que não estamos falando bem da mesma coisa, e por isso talvez até precisemos mesmo de um outro nome. E isso não seria assim tão descabido, se pensarmos em outras situações parecidas. O linguista indiano Kanavillil Rajagopolan, que trabalha há muitos anos no Brasil, diz que o “português” e o “brasileiro” têm mais diferenças entre si do que o hindi (falado na Índia) e o urdu (falado no Paquistão), que, no entanto, são reconhecidos politicamente como línguas diferentes.

Ao reconhecer as diferenças e podermos aceitar que somos diferentes, ou aceitar nossa individualidade linguística, nossa identidade separada, não menos válida, nosso objetivo é trabalhar a favor da nossa autoestima como falantes, gente que se expressa com propriedade comunicativa.

Assim, sendo um usuário da língua, que nasceu falando, é impossível – i m p o s s í v e l – que você não saiba essa língua.

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